07 abril, 2015

diálogos imaginários I

Ela se sentou ali,
daquela beiradinha de precipício que já era quase sua casa,
e ele sentou-se ao seu lado.
Seus cabelos tinham mudado (no geral estavam mais curtos)
e tinham umas ruguinhas novas nos cantos dos olhos
desde a última vez que tinham se visto.
Pareciam mais adultos.
Um pouco mais tristes (ou fosse tudo saudade)
Talvez fosse o cansaço
ou aquela diferença de fuso horário que deixava tudo bagunçado
aquela coincidência de roupas fim de inverno-aqui-começo-de-outono-ali
-eu não sei o que está acontecendo, irmãozinho
demorou tanto pra isso aqui se arrumar sem você
O vento batia frio jogando o cabelo dele na frente do rosto
-eu lembro sempre disso,
esse jeito de jogar o cabelo pra trás...duvido você perder isso algum dia
-é tipo a sua mexida de cabeça não tocando?
-tipo isso...
Aquele silêncio-cúmplice, percebeu, lhe vazia muita falta

....havia luto, e um embrulho de estômago naquela pausa.

-daí tinha aquele movimento só de pizzacato, dois, três dedos pra dar conta! 
-cinco tomates atravessaram a rua
-três horas de sono por noite
-olha a covinhaa!...
- e numa França sem você, um Berlioz...
-sabe, eu conheço você, não importa quão longe, em tempo ou distância, você vá
aqueles sinos vão sempre soar dentro de você.
Ela sorriu.
Seus lábios meio rachados manchados de roxo-vinho.
Ele passou o braço envolta dela, apontando na distância um sol fraco:
-essa mar é bem menor do que parece, sabe, duende?
nada que você não dê conta.
Sorriram com os olhos.
Antes do que imaginavam, voltariam a se abraçar.

14 janeiro, 2015

Eu me perdi, agora há pouco,
ali, naquela curva logo ali, vê?
ali me perdi de mim.
não lembro bem, mais que um bambeado nas pernas
tinha uma mala e chovia muito...
eu descia uma rua
pegava um ônibus
corria de uma sala
me deram um crachá
me deram uma passagem em branco.
eu trazia uma pilha de papéis embaixo dos braços
e conseguia carregar muito mais peso.
bem, bem mais que agora...
agora tudo parece cansaço
e um bilhete expirado.
Isso aqui me pesa nos braços
essa foto aqui, tua, que carrego pra lembrar
desses sorrisos, que faziam sentido apesar de
tudo em volta.
Tudo em volta é só o que resta agora
esses sorrisos aqui, e uns poucos outros,
embarcaram pra longe.
Inexistiriam nesse aqui de agora.
Logo aqui, bem agora, nada existe.
nada sobrou pra existir.
Só uma memória rasa de quando isso fazia sentido
acima e apesar de,
e você estava aqui, pra segurar os bambeios
de não acreditar em nenhuma das anteriores.

.::pro meu irmão Fúria